Quando se fala em
comunicação interna, muita gente ainda pensa no “jornal mural” como símbolo
máximo desse trabalho. Já faz tempo que pensar a comunicação de uma empresa –
seja ela de pequeno, médio ou grande porte - representa não apenas organizar a
informação institucional dentro de uma corporação. Acima de tudo, representa
ter uma visão mais humana, real e assertiva das pessoas e do trabalho.
As empresas só funcionam por causa das pessoas! São elas que
fazem qualquer negócio funcionar, seja apertando um botão ou auxiliando na
parte criativa de uma corporação. Uma frase atribuída a Peter Drucker
(considerado o pai da administração contemporânea) diz assim: “As empresas são
construídas com base na confiança, que, por sua vez, é construída com base na
comunicação e na compreensão mútua”. Se um desses itens falha é porque a
comunicação não está sendo eficaz.
Parece lógico, mas a princípio, os diretores (e muitos
colaboradores também) das corporações parecem ter dificuldade de assimilar que
a confiança e a compreensão mútua são consequências de uma comunicação bem
realizada. E mais, nem sempre dão a devida importância ao “clima
organizacional”, que pode sim ser agradável e de confiança entre as pessoas de
uma empresa.
Para explorar mais a fundo esse tema (comunicação +
colaboração + negócios) convidei duas “feras” na área da comunicação
corporativa para debaterem a comunicação corporativa. São figuras expoentes de
duas gerações diferentes, o que enriquece o nosso debate. E juntos vão trazer,
para nós, as novidades em relação à comunicação nas empresas, vão falar sobre o
papel chave da comunicação nas corporações e apontar as consequências de uma
comunicação pouco eficiente.
Reinaldo Ramos é jornalista, articulista e proprietário da RR
Comunicação Corporativa e Isabela Botaro é gerente de comunicação na D.E Master
Blenders, também na Região de São Paulo. Fiz várias perguntas a eles. A
primeira resposta é da Isabela e a segunda é do Reinaldo.
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Vamos começar pelo mais básico: expliquem, para que serve a comunicação
corporativa?
Isabela: Em uma frase, eu diria
que a comunicação dentro das organizações tem a missão de estabelecer processos
que proporcionam o diálogo entre a empresa e o funcionário por meio das mais
diversas ferramentas de comunicação que, em geral, assumem o papel de informar desde
os assuntos mais estratégicos para o negócio até aqueles mais funcionais e
relacionados ao dia a dia das pessoas.
Reinaldo – É
cada vez mais crucial. Em recente entrevista, Allen Morrison, diretor do respeitado Centro de Gestão Global
da Escola de Negócios suíça IMD, declarou: “o mau caráter é pior que um
incompetente”, completando: “desvios éticos podem destruir para sempre a imagem
de uma empresa”. Ou seja, hoje, as empresas são mundialmente obrigadas a manter
condutas éticas de fato similares às suas imagens públicas. Em outras palavras,
inverteu-se o antigo aforismo romano. Hoje, não basta a mulher de César parecer
honesta, ela terá, de fato, ser honesta. A Comunicação Corporativa tem tudo a
ver com isso. Não importa o porte da empresa: do CEO ao chão de fábrica, todos
devem estar nessa mesma sintonia. Com isso, a Comunicação, interna ou externa,
assume um papel estratégico, diria inédito, para o cotidiano de qualquer business.
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Existem várias ferramentas que fazem a comunicação girar dentro de uma empresa,
não é? Podem citar algumas?
Isabela: Entre
as ferramentas tradicionais eu destaco o e-mail, mural, jornal, e intranet, mas
também as redes sociais internas, TV corporativa e estação de Rádio, são boas
alternativas para gerar interação com o público interno. Eu os vejo como formas
de suportar (dar suporte) a comunicação face a face, pois acredito que ela tem
um poder imenso de mobilizar e engajar por meio do diálogo com a vantagem de obter
ofeedback imediato sobre um determinado tema.
Reinaldo – A
colega Isabela sintetizou muito bem as ferramentas disponíveis e o poder da
Comunicação Corporativa ao utilizá-las. Outras virão com muita rapidez, tenho
certeza. Gostaria de abordar mais um aspecto. Se no passado não tão remoto era
muito custoso concorrer com os rumores dos chamados “corredor press” ou a “rádio peão”, no
contemporâneo é dificílimo. Mas não impossível! Para não me alongar, resumo: o
responsável pela Comunicação precisa ser o primeiro a saber dos fatos e
estratégias da corporação, positivos e, sobretudo, negativos. Para isso,
parece-me imprescindível ter acesso à alta administração, ao board internacional se for o caso, e,
claro, colaborar estreitamente com setores chaves, como o RH. Além de ter voz
para que possa convencer e, assim, aplicar as ferramentas adequadas a cada
fato, como expert que é em sua área.
Ah, e lembrar sempre: somente fatos afastam boatos, além de que é pecado mortal
em comunicação brigar com os fatos.
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A comunicação não é aquela “informação” passada pela empresa e pregada no mural
dos corredores. A Comunicação Corporativa pode ser entendida como a maneira
como nos comunicamos dentro do ambiente de trabalho, certo? Portanto, todos têm
responsabilidade sobre a comunicação de uma empresa. Faz sentido isso para
vocês?
Isabela: O entendimento da
forma de se comunicar de uma empresa passa necessariamente pelo seu DNA, ou
seja, a sua cultura e os seus valores. Nesse contexto, a área de comunicação
contribui como especialista na definição da estratégia que, pautada no jeito de
ser da empresa, estabelece ferramentas para garantir o alinhamento da forma e
do discurso. Feito isso, quem sabe “aquela informação pregada no mural” faça
algum sentido para as pessoas. Se ela for definida única e exclusivamente pela
área de comunicação, a chance de não representar em nada as pessoas será
imensa. Por isso eu defendo o papel extremamente relevante da liderança como “embaixador”
desse jeito de ser. Não será com o papel pregado na parede que vamos conseguir gerar
o entendimento ou mudar o comportamento das pessoas, mas ele também tem a sua importância
à medida que é traduzido em atitudes do dia a dia.
Reinaldo –
De novo concordo com a Isabela: empresas são as pessoas. Sem conhecer as
pessoas, a Comunicação é só mais um cargo no organograma. E, nem sempre – acho
que hoje, mais do nunca – o que está inscrito na missão da empresa reflete a
cultura da empresa. A cultura da empresa são as pessoas no papel de
funcionários. Cabe à comunicação, utilizando a empatia – o saber se colocar no
lugar do outro, mesmo discordando – reescrever sempre que necessário essa
cultura. Apenas uma observação: penso que Comunicação Corporativa é uma
engrenagem na qual as peças (comunicação interna, externa, seus instrumentos,
ferramentas etc.) formam um todo maior que a soma das partes. E isto se reflete tanto interna como externamente.
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Muitos empresários não atribuem à boa comunicação uma maneira de atingir metas.
Como essas duas coisas têm correlação?
Isabela: Assim como lá fora as
empresas estão se esforçando para entender o comportamento do consumidor e
assim gerar vantagem competitiva no mercado, aqui dentro ela precisa exercer o
mesmo movimento, através de uma comunicação, ágil, direta e transparente trazendo
significado para o funcionário sobre qual a importância do seu trabalho para o atingimento
dos objetivos do negócio. Quanto mais clara for essa mensagem, mais bem
informado e envolvido com a missão do negócio ele estiver, melhor irá entregar
seus resultados. Ou seja, a comunicação trata de fornecer a visão global do
processo, além de apoiar no processo de transformação cultural.
Reinaldo
– O mundo está mudando cotidianamente em velocidade exponencial. Talvez os
empresários que você menciona na pergunta ainda não se deram conta que há uma
revolução digital em curso. E que seu motor é exatamente a comunicação. Olhando
dessa perspectiva, parece-me que fica evidente a correlação entre uma boa
comunicação, tanto interna como externa, com o alcance de metas de negócio. Um
exemplo: o primeiro passo para uma boa comunicação sempre foi conhecer os
públicos-alvo do business.
Arrisco-me a cogitar que, em face da revolução em curso, dificilmente se
atingirá metas sem conhecer, compreender e interpretar novos anseios e
necessidades de clientes, funcionários e demais públicos que compõem a cadeia
negócios da corporação empresarial – aí incluídos a mídia e formadores de
opinião.
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Muitos empresários também acreditam e esperam que os funcionários devam mudar a
sua comunicação. Na verdade, todos (inclusive os líderes) devem utilizar a
comunicação de maneira assertiva. A comunicação do líder, afinal, é de extrema
importância?
Isabela: A liderança é espelho
para a equipe! Tenha ela comportamento alinhado com os valores, crenças e
cultura da empresa ou não. O fato é que uma comunicação eficaz precisa,
necessariamente, passar pelas mãos do líder. Por essa razão as empresas estão
investindo cada vez mais na formação do líder para exercer esse papel
entendendo que, com uma comunicação mais assertiva os resultados serão
expressivos para o negócio. Um profissional é o melhor porta-voz da empresa em
que trabalha. Uma pessoa de dentro da organização tem toda a credibilidade
necessária para defender ou destruir uma marca.
Reinaldo – Ô!
O verdadeiro líder, para mim, tem como uma das suas qualificações essenciais
ser um comunicador. Claro, cada caso é um caso. Portanto, cada equipe é uma
equipe. Penso que cabe à Comunicação Corporativa identificar as pessoas sob a persona dos líderes e dos componentes de
cada equipe. E, também acho: porta-voz da empresa é o líder (ou o especialista em
cada área específica – de novo, do CEO ao chão de fábrica). E Media Training é
um instrumento de Comunicação que, acho, quanto mais for incluído nos processos
internos de Treinamento & Desenvolvimento mais próximos estarão os
funcionários do que almejam os empresários que você citou na pergunta.
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Deixar os funcionários opinarem sobre qualquer parte do processo de uma empresa
é fundamental para uma boa comunicação corporativa?
Isabela: Quando a cultura da
empresa permite essa abertura e incentiva a participação, sim. Dito isso, eu
acredito que vale o esforço de dedicar um minuto para perguntar e outro minuto
para ouvir com atenção o que o funcionário tem a dizer. Primeiro porque ao ter
a oportunidade de compartilhar o que pensa o funcionário sente-se reconhecido e
respeitado. Segundo que, ao adotar essa prática a empresa poderá encontrar
dentro de casa soluções dos problemas do dia a dia.
RR –
Isabela, ‘tô concordando demais da conta com você, não é verdade? Só
acrescentaria que corporações, necessariamente, precisam de alguma hierarquia
pra funcionar. Mas, sobretudo do ponto de vista da Comunicação, escutar (e
consultar) é primordial. E, também sob esse olhar, há uma diferença entre
escutar e apenas ‘ouvir’. Escutar pressupõe se colocar no lugar do outro e, só
depois disso, avaliar o impacto que a opinião terá sobre a eficiência, a
eficácia e, principalmente, a mudança da cultura da empresa para melhor.
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Que sugestões vocês dão para as empresas que querem implantar a comunicação
interna?
Isabela: Estude!
A cultura da empresa, o estilo de liderança, o perfil dos funcionários. Dialogue
com as pessoas para entender os seus pontos de vista e também com a alta
gestão, para então fazer um cruzamento das expectativas com relação aos objetivos
do negócio. A partir daí, eu acredito que fica mais simples saber qual caminho
seguir.
Reinaldo –
Estude de tudo! Segundo o Prêmio Nobel da Literatura, Saramago: “as crianças e,
principalmente, os adultos devem ler de tudo, de preferência o que não entendem
– sobretudo os adultos”. Além disso: escutem o outro. Sempre. Se discordarem, façam-no
com assertividade, mas com muita educação. E uma última sugestão: não tenham
medo de errar. Aprendam com o erro. Como disse Clarisse Lispector: “o erro é
também um caminho”.
Leitor,
veja quantas coisas aprendemos com esses dois profissionais, não: Isabela e
Reinaldo, agradeço muito a participação de vocês!
Isabela
Botaro é publicitária, especialista em comunicação com MBA em Gestão
Empresarial pela FGV. Possui 10 anos de experiência profissional adquirida em
empresas nacionais e multinacionais. Apaixonada por gente e pelas suas
histórias encontra a paz em um simples bate papo - com gente ou com livros -
acompanhado de um bom café.
Reinaldo
Ramos é jornalista há quase 40 anos, com particular
atuação em negócios, economia e política. Foi repórter e editor em revistas e
jornais como “O Globo”, “Jornal do Brasil” e “O Estado de S. Paulo”. Formado
pela USP, especializou-se em Comunicação Corporativa, exercendo cargos como
executivo de grandes organizações locais e multinacionais, além de prestar
consultoria para empresas e lideranças empresarias. É articulista em diversas
mídias e proprietário da RR Comunicação Corporativa. https://plus.google.com/u/0/+ReinaldoRamosjornalista/posts/p/pub