Uma das coisas mais lindas da linguagem é a infinita
possibilidade de combinações que podemos fazer para passar uma mensagem. Aliás,
falamos porque temos necessidade de conversar.
E para conversar, estabelecemos trocas, muitas vezes
deliciosas. Podemos elogiar alguém; agradecer uma gentileza; ajudar uma pessoa
em aflição ou até suavizar uma dor através da nossa linguagem. A nossa
possibilidade é infinita quando queremos agradar alguém. Vejam os
poetas, por exemplo, quantas palavras bonitas traduzem o amor?
É um fato, no entanto, que as combinações que fazemos da
linguagem nem sempre são usadas de maneira a trazer o benefício. Quantas vezes
já tivemos a intenção de usar a linguagem para machucar alguém? Se você já xingou
qualquer pessoa se encaixa, perfeitamente, nesse exemplo.
Mas, será que usamos a linguagem de maneira inadequada apenas
quando xingamos? Obviamente, não. A linguagem pode ser usada de maneira
perigosa. Quantas vezes percebemos a maledicência de quem está ao nosso redor?
Ou então, quem nunca foi vítima de um comentário estranho feito de uma maneira
muito educada? É, são as artimanhas da linguagem! Podemos fazer tudo o que
quisermos com a nossa comunicação, só não podemos nos esquecer de que tudo o
que falamos tem consequências.
É o que eu chamo de dano e reparação. Quando assumimos o
risco de agredir, estamos também assumindo a responsabilidade pelo dano
causado. Mesmo quando não temos tanta consciência assim sobre o que dissemos, o
outro (quem ficou ofendido) vai lembrar que aquilo que foi dito não deveria ter
sido falado de tal maneira. E, em algum momento, a reparação vai ser
necessária.
Nem sempre é possível controlar tudo o que falamos. Esses
dias, puxei conversa com uma mãe que estava com uma criança no colo. E, então, eu
disse: “nossa, ela é a sua carinha”. A mãe, meio sem jeito, me disse: “ela é
adotiva, não pude ter filhos”. Nessa hora eu pensei porque que eu havia aberto
a minha boca. Não podia ter ficado quieta?
Pois, é! Mesmo sem querer, podemos causar danos através da
linguagem. E, neste caso, é melhor admitir que erramos e fazer a reparação.
Para a mãe da criança, eu disse: “me desculpa, fui tão invasiva. Eu não tenho
nada a ver com a vida da senhora. Apenas achei a menina bonitinha”. A desculpa
foi aceita.
Mas, e quando o dano é
bem maior do que isso? E quando temos a intenção de ferir através da linguagem?
Eu sempre digo que grandes guerras começaram por causa da falta de “ouvir” o que o
outro está nos dizendo. Se eu não me coloco no lugar do outro quando converso é
bem provável que eu não entenda o contexto que aquela fala foi dita e porque
foi dita. O que pode gerar ruídos.
Por isso, acredito que o bom uso da linguagem só é possível
quando exercemos a troca justa com o nosso interlocutor. É preciso ouvir para depois falar. E se mesmo que eu não tenha tido a intenção de magoar alguém através da linguagem, mas fiz, será
que essa pessoa vai deixar de ficar magoada se não me posicionar com humildade
e admitir o erro e me reparar?
Pouco provável. E quando algo dito e não reparado toma dimensões maiores
pode representar o fim de famílias, de relacionamentos, da diplomacia entre
estados.
Será que em uma Era em que a comunicação é tão acessível e
abundante ainda não aprendemos a ouvir aquilo que nós mesmos dizemos?
Se não prestamos atenção na nossa comunicação ficamos no ciclo
entre o dano e a reparação. Até quando iremos reparar se podemos usar nossa
linguagem de outra maneira?
Eu prefiro acreditar
que a linguagem é uma infinita possibilidade de combinações que podemos fazer
para passar uma mensagem, sem dano, nem reparação.
1 comentários:
Muito reflexivo! Congrats ;)
Camila Bianchi
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