O que há entre a realidade
e a imaginação? Entre a verdade e a ilusão? Entre a fala e a reação?
Esses são alguns questionamentos que lanço para você que lê este
site. E foi para "filosofar" um pouco sobre a vida que entrei, há
poucos dias, em um café. Sentei-me em uma mesa no canto e pedi um copo de água.
Queria apenas digerir o momento, sem nenhum sabor extra. E então, foi que me deixei
abandonar, sem nenhum pensamento sobre quem eu era naquele momento, e observei a
vida ali pulsante.
Percebi pequenos atos feitos por desconhecidos como se fossem
peças de teatro ocorrendo simultaneamente. Pude ver em cada rosto expressões
diferentes, como a alegria, a tristeza, o conforto, a busca do outro, a falta
do que buscar. E percebi também que a conversa ao acaso faz das pessoas o que
elas são, mesmo que não percebam isso.
Vi uma mulher sorrir para outra e, instantes depois, virar a
cara e sair brigada com a amiga. Ou seria sua colega? Vi um senhor olhar um
cachorro lá fora e conversar com ele através do vidro. Vi uma mulher decotada
flertar com o garçom e pedir uma bebida com álcool. Observei também que um
senhor me observava e me apontou com o dedo para um amigo, também já senhor de
idade. Vi uma moça tomar cinco xícaras de café, sem exagero, enquanto falava
com o namorado. Pelo tom da conversa em histeria, poderia ser o amante, pensei.
O que unia essas pessoas – ou as desunia – era a maneira como elas conversavam,
sem que elas notassem isso.
Alguns estavam curvados para os outros, demonstrando profundo
interesse pelo interlocutor naquela situação. Outros estavam praticamente
sentados de lado ou em paralelo, como se quisessem evitar aquele momento. Vi
muitas pernas cruzadas em sinal de elegância, mas pés impacientes para a próxima
fala.
Quantas ênfases e entonações e depreciações ou elogios podem
haver em apenas uma conversa? Só sei que naquela meia hora em que estive
sentada, observando tudo ao redor, percebi que não nos damos conta dos
diálogos que podemos ter, como pequenos tesouros. Quanto de profundidade ou de raso
existe naquilo que é dito?
Acredito que há tanta vida em uma conversa franca, mesmo que
ocasional, quanto em um ano inteiro de silêncio meditativo. Não que uma
conversa com a gente mesmo não possa ser interessante. Longe disso! Adoro me levar
para tomar café, por exemplo. Mas, acredito que às vezes é importante ouvirmos
uma voz que não a nossa, para não nos viciarmos com nossos próprios conceitos, nossos
preconceitos, com as mentiras que inventamos para nós mesmos ou verdades que
temos como absolutas.
E quando me dei conta, ainda no café, estava questionando: o que há entre a realidade e a imaginação? Entre a verdade e a
ilusão? Entre a fala e a reação?
Entre tudo isso, há aquilo que chamo de conversa. Mesmo que seja
real ou ficcional ou até imaginária, o que importa são os ecos das conversas
que tivemos até então, e que tornaram cada momento verdadeiro ou mentiroso. É a
fala e a reação sobre aquilo que expressamos.
Por
isso, recomendo as conversas não como doses homeopáticas. Tome overdoses de
conversas. Fale! Troque! Entenda! Questione! Aceite ou rejeite! É para isso que
conversamos. Não estamos imunes ao diálogo. Ele vai aparecer, mais cedo ou mais
tarde, para ter um papinho com você.
Ao
final da minha pesquisa, levantei-me lentamente da cadeira para poder saborear
o que ainda restava no ar daqueles momentos, que foram únicos. Logo que saí
pela porta, pensei: isso não vai acontecer de novo, não desta maneira.
Naquele
período de tempo no café, não conversei com ninguém para que hoje pudesse
conversar com você sobre isso.
Escolhi a conversa para inaugurar o ano neste site. Se pudesse
dar as boas-vindas ao seu ano, leitor, eu diria: converse! Apenas.